domingo, 29 de maio de 2011




DA UTOPIA 2



ALIMENTAÇÃO



a briga que hoje se vê entre ambientalistas e o agronegócio, vem lá de trás. quando nos anos 60 se quebrou tudo, uma das pedras atingiu o templo dos hábitos alimentares. não comer carne e açúcar eram regras básicas. por quê ? porque nosso organismo não é feito pra isso. é como usar um programa que seu sistema operacional não leia. desrespeitar isso, é ferir nossa natureza e gerar doenças sem fim.

nos anos 60, um movimento gigantesco de jovens no mundo inteiro quis mudar com tudo isso. abandonando as cidades poluídas, carcinadas, voltando a cuidar da terra e do corpo. vivendo em comunidades onde plantavam o que comiam, respiravam fundo e dançavam. a luta foi dura contra um sistema patriarcal milenar, apoiado na tradição, na família e na propriedade. briga que se espraia até nossos dias.

como será o novo código florestal? já viveríamos num gigantesco deserto de bois e pastos, de terra enxovalhada de agrotóxicos, não fosse aquela percepção psicodélica despertada há cinqüenta anos. fizeram de tudo para, como se diz “desconstruir a imagem” do movimento. a imprensa chamando de bicho grilo, riponga, natureba e outros achincalhes. talvez fosse preciso adequar os novos hábitos à linguagem do mercado. encarar o mundo de frente, negociar com ele. então os hippies se transmutaram em ambientalistas, a comida natural em produtos orgânicos e as comunidades no campo em economia auto sustentável. a luta continua.



SAÚDE, DISCERNIMENTO, ENTUSIASMO



quando se fala em utopia, pensa-se no inatingível, coisa de maluco. é mais fácil manter sua vidinha padrão, com pequenos deslizes, justificáveis com ‘todo mundo faz assim”, que embarcar numa viagem sem volta, atrás do que é só conjectura. muitos não sabem nem como zarpar, que ônibus pega, em que estação. não tem no goggle maps.

um bom início é a alimentação. uma vez tive um sonho. sonhei com um gigantesco olho vermelho e seco. era o meu olho, cego, inútil. resolvi parar de me intoxicar. aprendi a macrobiótica. e fui viajar na dieta vegetal na casa dos meus pais, pequena burguesia comedora de açúcar, leite, ovos, que do boi, comia das carnes nobres aos miúdos todos. tinham boas intenções e ultrapassadas noções de saúde. minha primeira grande transgressão foi invadir o fogão da casa para preparar minha alimentação. foi uma heresia, um espanto. fui perdendo peso. dias de arroz. quase levitava. um faquir da dor no reino do excesso e da fartura. era eu me modelando. aquele olho seco nunca mais me assombrou.

inventei um dístico: saúde, discernimento, entusiasmo. tudo parte da saúde. do natural e potente funcionamento do organismo. o corpo na plenitude do seu equilíbrio térmico. sem gerar, através da má digestão, fermentação, putrefação cancerígena. radical? sim, um esporte radical. e solitário. isso é o início de tudo. base para separar o joio do trigo e escolher o caminho a tomar. em uma palavra: discernimento

por muito tempo acreditei que a droga, o desregramento dos sentidos, poderia soprar no meu ouvido, a trilha a seguir no meio do nevoeiro. vozes de santos, brujos, orixás. delegava uma responsabilidade que a mim cabia. dentro do nevoeiro, toda sibila era viável. mas não existe milagre ou iluminação instantânea. existe você e o mundo. e é preciso que se apresentem um ao outro. isso acontece quando você começar a pisar com o pé no chão e olhar com o olho vivo de quem quer jogo. aí o mundo se apresenta e você ganha um parceiro, um amigo, um aliado. e você define o que quer. e desenha o caminho. miragens, simulacros fantasmáticos, aparecerão sempre, por supuesto. mas com os pés no chão, ar nos pulmões, sol na língua, você luta e vence. com todo entusiasmo. afinal você pertence a uma estirpe de guerreiros.

 hasta la victoria ! 

 



sexta-feira, 27 de maio de 2011

DA UTOPIA 1



sos

tem gente morrendo de medo
tem gente morrendo de esquitossomose
tem gente morrendo de hepatite miningite sifilite
tem gente morrendo de fome
tem gente morrendo por muitas causas

nós, que não somos médicos, psiquiatras,
nem ao menos bons cristãos,
nos dedicamos a salvar pessoas
que, como nós,
sofrem de um mal misterioso: o sufoco.

circa 74, performei esse poema no terraço de uma escola para crianças em ipanema, num happening inventado por fernando lemos. falei com uma cadeira virada pra baixo em cima da cabeça. antenas da raça. heloísa buarque, a sagaz, passou a chamar aquela turma que pintava, como geração do sufoco.

e que sentimento era esse? simplesmente o mal estar da civilização, o ennui dos dias dentão, o spleen brasil anos 70. a rebordosa de um momento de extrema riqueza estética e utópica dos anos 60. o medo da truculência barra pesada da ditadura. e o desconforto de viver num mundo em que os valores se voltavam para o dinheiro e o consumo.

era a mudança do capitalismo focado na produção para o capitalismo centrado no consumo. do sólido para o líqüido, como diz bauman. até então, bem ou mal, tínhamos nossas bandeiras: a Revolução, novas formas de ver o mundo e viver a vida, a criação de novas relações entre as pessoas, mais afetivas, menos competitivas. isso era um sonho que se sonhava junto. não era uma utopia. era um desejo que vivíamos para realizar.

mas o sistema capitalista se encarregou de inviabilizar esse desejo de milhares de pessoas, se transmutando em economia de mercado, esvaziando qualquer discussão ideológica e através da publicidade, a alma do negócio, narcotizar a massa para o consumo. "não se discute, não se conversa, consume-se".

no início dos 80, o estouro das bolsas de valores, os yuppies, o capital não mais ancorado no trabalho e na produção, mas no investimento em ações. capital volátil, dinheiro gerando dinheiro e a explosão do cartão de crédito. era preciso ter. consumir a qualquer custo, através do endividamento crescente das pessoas em favor de bancos agiotas. essa era a nova cara do inimigo invisível, “não-ideológico”: consumir a todo custo. consumo gera empréstimo, empréstimo gera juros, juros sobre o juros, bola de neve impagável, mais cruel q qualquer ditadura.  

qual é a cultura desse estágio do capitalismo focado no consumo, também chamado de neo-liberalismo? zumbis que só pensam em comprar coisas, status, aparecer. uma mídia tirana que ao mesmo tempo que vende produtos, vira partido político, braço armado do neoliberalismo, transforma pessoas, sentimentos, desejos em mercadorias.

é contra isso que os jovens se revoltaram nos 80 e foram transformados pela mídia em punks, em hippies de boutique. e é isso que hoje levam às ruas, em dezenas de países do norte da áfrica, do oriente média e agora na espanha, milhares de jovens, que agora se comunicam digitalmente, sem a interferência da mídia tradicional. se levantam contra o sufoco, essa coisa intangível, esse sentimento de impotência, de abulia que a sociedade do consumo imprime nas pessoas. contra esse estado de coisa, essa coisificação. contra um sistema que não distribui, mas acumula nas mãos de poucos, que não cuida do meio ambiente, mas desmata e polui. desmata qualquer tipo de reação e polui toda dignidade e expressão humana.

contra isso os jovens estão na praça do sol em madri, como estiveram no egito, na líbia, na síria, no iemen, na tunísia, na grécia. pessoas que saem às ruas para se sentirem novamente pessoas, cidadãos, pelo prazer de estar juntos e lutar. em breve, aqui.


quinta-feira, 12 de maio de 2011

VIRADA PAULISTA 2011



em 72 com 21 anos e 2 livros em mimiógrafo, fui pra londres viver a vida. Vi o poeta Allen Ginsberg num festival e aprendi a falar um poema. Amanhã embarco para Presidente Prudente, como fui à Marília e Assis no ano passado, interior de São Paulo, para falar poemas na Virada Paulista 2011. Pode ser q isso deflagre em alguém na platéia o gosto de tornar poesia, espetáculo. como diz mestre tavinho paes, poema é show.

segunda-feira, 2 de maio de 2011